quarta-feira, 30 de abril de 2014

Terapia ocupacional em crianças com TDAH

"...você é médica? vai me ajudar a parar o meu corpo?"
Por Ana Elizabeth Prado
Crefito 3/1670
Nada melhor do que escutar quem entende do assunto: a própria criança. Ela nos dá a dica do que não anda bem em sua vida.
Este é o questionamento de um menino de 5 anos de idade iniciando um programa de terapia ocupacional na abordagem de Integração Sensorial. Diante dos materiais disponíveis na sala Marcos* escolheu brincar de se pendurar no trapézio e cair em um colchão inflável na contagem "1,2, 3 e já", gritando a "palavra de guerra" escolhida por ele.
Combinamos previamente e planejamos como seria a brincadeira.
Para isso acontecer foi necessário a minha mediação para Marcos poder selecionar os materiais, sustentar a atenção aos passos da construção da brincadeira, bem como lembrar sobre o cuidado com sua segurança. Só durante a ação descobriu que precisava subir em algo como um puff para alcançar o trapézio. Que era necessário uma certa distância entre o puff e o colchão para conseguir acertar o pulo no alvo. E que precisava se manter por um tempo se pendurando pelas mãos percebendo o tempo da contagem até se soltar e cair. Percebeu ainda que era difícil falar a palavra enquanto pulava, preferindo só pular.
Fiquem atentos a todas necessidades para a participação de Marcos na brincadeira.
Depois propus para ele registrar a brincadeira por um desenho mas não foi possível para ele, por enquanto.
No meio da brincadeira me chamou atenção a elaboração de sua pergunta:
M- " isto faz parar meu corpo?"
Eu- " você está falando sobre o que?"
M- " ...essa brincadeira...você é médica? vai me ajudar a parar o meu corpo?"...e conversamos sobre o que estava lhe angustiando e o motivo de ele vir a terapia ocupacional.
Marcos apresenta excelente nível intelectual e veio indicado pela escola devido a quedas frequentes e dificuldades de atenção.
A aparente simplicidade desta brincadeira requer muitas habilidades, dentre elas: domínio do próprio corpo, e do corpo no ambiente; evocar uma intenção e formular uma ideia, implícita a motivação; ativar a memória; dirigir, focar e sustentar a atenção; planejar, selecionar os materiais e estratégias para se chegar ao objetivo; inibir uma ação para priorizar a principal; habilidade para iniciar, prosseguir e finalizar ações sequenciais de modo integrado do seu corpo com o meio.
Muitas destas habilidades são difíceis em crianças com sinais sugestivos de Disfunção de Processamento Sensorial, presente em algumas crianças com diagnóstico de Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH).
Trouxe este comentário para ilustrar o quanto algumas crianças desde tão jovens passam por momentos em que se vêem não correspondendo a si próprio ou aos pais, professores e amigos devido às alterações no modo como recebem, modulam ou processam as informações sensoriais.
Muitas famílias trazem como queixa as quedas frequentes, inquietação, "preguiça", falta de atenção, atraso na aprendizagem da leitura e escrita, preferências por brincadeiras muito infantis e falta de organização nas atividades de auto cuidado, às vezes com prejuízo na interação social.
Este assunto envolve vários aspectos emocionais, cognitivos e sensoriais. É difícil até para as famílias escolher o tratamento mais adequado principalmente quando é necessário uma equipe multidisciplinar.
Acredito que podemos começar escutando as necessidades da criança e das pessoas que se relacionam com ela, e a partir daí ir em busca de diagnóstico e intervenção terapêutica. Em crianças com TDAH, a depender do caso, é necessário entrar com medicação por indicação médica como auxílio, mas não esquecendo de valorizar o apoio à criança no sentido de favorecer uma qualidade melhor de relação dela no meio em que vive, seja na escola, em casa ou no meio social.
Neste último entra o papel do terapeuta ocupacional criando um ambiente com oportunidades onde a criança irá vivenciar o seu corpo no campo sensório motor, elencando brincadeiras junto à criança para integrar corpo, atenção e memória, organizando no tempo e espaço.
Do concreto ao abstrato.
Do real ao imaginário.
É a cognição ligada a vivência corporal. Essencial para as funções executivas.
É do corpo que se começa e que constrói  a história...

Integrando os sentidos do próprio corpo no contexto lúdico

  

Quer saber mais? Leia também


Marcos - nome fictício

sexta-feira, 25 de abril de 2014

Dica de brinquedo para coordenação motora e propriocepção


Por Ana Elizabeth Prado
Crefito 3/1670 TO

Anda-duo da New Art Toys. Comprei recentemente. Aprovado!
Ideal para crianças, adolescentes e adultos para desenvolver a coordenação motora enquanto se divertem. Vivenciando o equilíbrio e desequilíbrio.
Refinando a propriocepção: combinando o passo com o outro se trabalha a frequência, intensidade, direção e amplitude de movimento, além de favorecer a transferência de peso e lateralidade. 
Tudo isto estimulando a atenção e ação colaborativa com o outro.
Quer mais?
Na prática de Integração Sensorial experimentei até agora especialmente no trabalho com crianças com dispraxia e as que precisam amadurecer nas questões de integração bilateral e sequenciamento.
Estava também procurando algo divertido para quem precisa da consciência de flexão de joelho no passo e dominar o ritmo no andar. Achei!
Lembrando da máxima: " só dominamos o andar de fato quando aprendemos a parar" ou ainda "dosar o passo".
Bom trabalho e diversão.
link da NewArtToys

segunda-feira, 21 de abril de 2014

A terapia de Integração Sensorial com bebês prematuros

Por Ana Elizabeth Prado
Crefito 3/1670 TO

Os primeiros anos de vida formam a base da formação da personalidade, inclusive desde os meses gestacionais. Nesta afirmação não há intenção em determinar destinos, mas pelo contrário olhar para as inúmeras possibilidades da construção dos modos de viver. 

O modo de sentir, agir e pensar são interdependentes formando como em um caleidoscópio interações contínuas, instantâneas que se perduram e se reciclam durante toda a nossa vida.

Sentir, agir e pensar têm implícito o corpo com toda a sua história subjetiva e social. Tem começo e fim. Recheado de meios que são influenciados por inúmeros eventos. 
O nascimento é um deles. E tão importante!

Algumas famílias passam por momentos difíceis em gestações de alto risco e, por vezes, nascimentos prematuros. Além do risco da sobrevida podem ocorrer situações não previstas como os cuidados do neonato na UTI por complicações respiratórias, e até alguns eventos de cunho neurológico. 

O sistema nervoso é uma rede delicada e complexa responsável por toda a conexão interna e externa do ser humano. Considerando toda a capacidade do sistema nervoso de se recuperar de algum trauma, temos que contar também com os eventos em que alguma conexão cerebral foi estabelecida de forma diferente ou imatura e pela qual será necessário de ajuda específica.

Muitas vezes por serem tão pequenos, a consequência dos "acidentes" neurológicos se tornarão visíveis mais tarde na vida da criança, por exemplo em dificuldade de coordenação, em relação a atenção nas atividades escolares, entre outras. Entretanto, é comum quando colhemos a história dos primeiros meses de vida ouvir da mãe como era diferente o sono ou a hora de mamar, na atitude de sentir as texturas, ou de se movimentar. 

Vamos lembrar que isto não é lei. São referências da escuta dos pais em anos da minha prática, mas que se comprovam pelos inúmeros estudos. 

É possível que algumas crianças prematuras, e seus pais, passem por períodos em que necessitem de ajuda para organizar  o cotidiano principalmente em relação aos primeiros cuidados básicos como sono, alimentação, banho, troca de fraldas e roupa, interação e brincar.

Devido a tudo isto, é recomendável que toda criança que tenha tido algum sofrimento antes, durante ou após o parto seja acompanhada nos primeiros anos de vida, no mínimo pelo pediatra e, se o mesmo não fizer avaliações periódicas para seguir de perto o nível de desenvolvimento neuropsicomotor, que encaminhe a um profissional especializado por uma medida preventiva.

Como a terapia ocupacional pode ajudar?

Por meio da escuta dos pais, observação do desenvolvimento da criança e complementando com avaliações específicas, é possível perceber se há necessidade de acompanhamento, e em que área. 

Se houver necessidade de intervenção o terapeuta ocupacional dará dicas para melhorar a qualidade de vida da família, como perceber as reações da criança de acordo com a faixa etária, orientar em como prosseguir nos horários de cuidados básicos e de interação com a criança. Sugerir formas de contato e brincadeiras e, se necessário, readaptação da rotina, entre outras. 

A terapia de integração sensorial ajudará a entender como se dá o processo da autorregulação da criança nos diferentes horários, na interação com as pessoas, nas atividades e ambientes e, se houver algum sinal de dificuldade no processamento das informações sensoriais, criará um programa com brincadeiras para que a criança siga seu desenvolvimento com o mínimo de estresse. As atividades serão de acordo com o contexto significativo de cada criança e sua família.

Brincar graduando os desafios sensório motores e as ofertas dos estímulos sensoriais.
Ampliando territórios.

Fiquem atentos, pois desde a época mais precoce podem aparecer os primeiros sinais de alteração de Integração Sensorial no desenvolvimento!

Quais os sinais importantes para perceber se algo não está de acordo? 
Já falei  tanto em postagens anteriores que vou colocar os links para cada um acessar de acordo com o interesse.

Quando a terapia de Integração Sensorial pode ajudar
Choro excessivo e Dicas gerais
Atraso de desenvolvimento
Recusa alimentar
Cuidados básicos - Banho

Aproveito para deixar o link de um estudo referente ao assunto publicado no Jornal de Pediatria que conclui: "Crianças prematuras estão mais susceptíveis a prejuízos de desenvolvimento nas áreas motora, de comportamento e de desempenho escolar, quando comparadas a crianças a termo. Esses prejuízos são modulados por fatores biológicos e ambientais, que determinam sua intensidade".
Efeitos do nascimento prematuro

sexta-feira, 18 de abril de 2014

"Eutonia, a pele consciente" na vida de uma terapeuta ocupacional


Por Ana Elizabeth Prado
Crefito 3/1670 TO
Como algumas pessoas já sabem fiz especialização também em Eutonia. 
Parece que gosto de metodologia que muitas pessoas não tem a noção do que se trata?
Não é bem isso. 

A Terapia Ocupacional, Integração Sensorial e a Eutonia (as quais me formei e vivo há alguns anos) são práticas que lidam diretamente com a qualidade de vida do ser humano, que têm uma embasamento teórico bem preciso. 

A Eutonia teve um diferencial a mais, pois na formação cada aluno precisa viver o processo em si para depois poder se formar como Eutonista. Não é uma metodologia "passada", mas vivida na própria pele...ossos, músculos...no espaço interior com e no espaço exterior levando a um desenvolvimento da consciência corporal nas diferentes dimensões.

Apesar destas práticas, e talvez por isso, não terem um reconhecimento amplo na mídia, elas tratam de questões do nosso dia-a-dia. É tão simples, causal e consequente que pode escapar das nossas vistas. Possivelmente porque está sempre aqui, no meio de nós, consciente ou não: como podemos manejar melhor a nossa vida conhecendo o nosso modo de ser, o próprio corpo, acolher as particularidades, as similaridades com os outros. Como podemos regular o tônus diminuindo o estresse da vida nas grandes cidades, como podemos prevenir dores, ampliar repertório de  movimentos, sentidos e interesses... compartilhar habilidades e emoções. 

Estas são algumas razões que escolhi este caminho profissional que está implícito lidar com o prosseguindo da evolução de muitas vidas.

Quer saber mais sobre Eutonia? 
Leia um trecho do texto da Màrcia Bozon. Muito bom. Segue o link abaixo.
"A eutonia parte do princípio de que todo organismo vivo tem a capacidade nata de autorregulação, pois durante um único dia vivemos inúmeras situações, sendo que em cada uma delas são produzidas múltiplas alterações fisiológicas em nosso organismo, provocando mudanças no nosso estado geral no que se refere, por exemplo, à nossa disposição ou indisposição para a ação, nosso nível de atenção ou de dispersão, nossa sensação de tensão (nervosismo, ansiedade) ou relaxamento (calma, tranquilidade), etc. Cada um destes estados possui padrões próprios de funcionamento que são, por sua vez, variáveis e transitórios, dependendo do momento e das circunstâncias, sendo que muitas vezes nosso corpo efetua operações complexas sem que tenhamos consciência de como isto está ocorrendo.
A eutonia nos propõe uma prática de atenção aos processos corporais, desde a tomada de consciência das nossas características físicas (peso, volume, forma corporal, presença da pele, da estrutura óssea, etc.), passando pela relação com o ambiente e todos os estímulos dele provenientes, até a atenção sobre os processos subjetivos que acompanham os estados corporais como os sentimentos, os pensamentos e as emoções. Trata-se, portanto, de uma abordagem somato-psíquica do ser humano, a qual considera que os processos corporais estão diretamente interligados aos processos mentais, emocionais e psíquicos."